11 julho 2011

Sobre Gueixas

"... Acho que Hatsumomo não poderia ter encontrado nada mais cruel para me dizer. Por um ano e meio, agora, eu fora condenada às duras condições da vida de criada. Sentia minha vida estender-se diante de mim como um longo caminho que não leva a lugar nenhum. Não quero dizer que desejasse me tornar uma queixa. Mas certamente não queria ser uma criada para sempre. Fiquei longo tempo parada no jardim da escola observando outras meninas da minha idade conversando entre si ao passar. Podiam estar voltando ao seu okiya para o almoço, mas para mim estavam indo de uma coisa importante para outra, com objetivo em suas vidas enquanto eu voltaria para algo que não mais glamouroso do que esfregar pedras no pátio. Quando o pátio ficou vazio, fiquei parada preocupando-me porque talvez fosse um sinal que eu estava esperando - que outras meninas do Gion iriam progredir em suas vidas, deixando-me atrás. Essa ideia me deu tal medo que não consegui mais ficar sozinha no jardim. caminhei pela Avenida Shijo, e dobrei em direção ao Rio Kamo. Bandeiras gigantes no Teatro Minamiza anunciavam uma peça kabuki naquela tarde, chamada Shibakaku, uma de nossas peças mais famosas, embora eu nada soubesse de kabuki naquele tempo. Multidões subiam os degraus, entrando no teatro. Entre os homens em seus ternos escuros de estilo ocidental destacavam-se várias gueixas em cores brilhantes como folhas de outono nas águas barrentas de um rio. Ali mais uma vez vi a vida em toda a sua rumorosa excitação, passando por mim. Afastei-me depressa da avenida, descendo a rua lateral ao longo do Riacho Shirakawa, mas mesmo ali homens e gueixas corriam seguindo suas vidas tão cheias de objetivo. Para fugir dessa dor virei-me para o Shirakawa, mas cruelmente até suas águas deslizavam com objetivo - para o Rio Kamo e de lá para a Baía de Osaka e o mar de Dentro. A mesma mensagem parecia esperar por mim em toda a parte. Deixei-me cair numa pequena amurada de pedra na beira do rio e chorei. eu era uma ilha abandonada no meio do oceano, sem passado e sem futuro. Logo senti que chegava a um ponto em que nenhuma voz humana poderia me alcançar - até ouvir uma voz masculina dizer:
- Ora, um dia tão bonito para ser tão infeliz."
(Arthur Golden - Memórias de uma Gueixa, pg. 119)


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